domingo, 11 de janeiro de 2009

Dia de sol e mar: desventuras de um barquinho solitário.

Domingo é dia vazio: abre espaço no peito para a vez da crise, erra o leme que de certo entende o des-norte. Neste barquinho simples, estamos sempre buscando um canto, um lugar autêntico: um lugar nosso? Para uma viagem tranqüila, um caminho para uma ilha, um recanto de repouso, paz e felicidade. Ah... mas o barco que nos guia, em mar, vento e desventura, não é experiência de dentro que realizamos fácil e doce como em sonho. Este mar nós dividimos, e há os esfarrapados, os descabidos no mundo, que se penduram, sobem por força, temendo a fome e a morte, fazem pela insistência balançar o bote – nossa propriedade privada. Nós, do centro de nosso recanto existencial, aprendemos a raiva a estes que não tendo barco querem nos ocupar, nutrimos assim o bicho estranho da posse (com ração e Jornal Nacional), que nos faria derrubá-los e matá-los a pau, não fosse o estado, a justiça e a polícia, que servem para dar cabo destes vis, mas, supostamente justificados impulsos. Domingo é dia vazio, nos faz desgarrar o leme, é dia vazio de porta aberta, por onde entram incertezas, elas, quem sabe? Nos levarão ao fundo do mar, agarrados aqueles que não têm barcos existenciais a vagar num dia de domingo. Será que enfrentando as ondas no braço e no peito, ladeando o desespero dos que lutam pela vida, não nos ocorre que a busca pela felicidade em ilhas de prateleiras, romances e propagandas, se aproxima à busca de um tesouro perdido. Não fala a TV que o precioso tesouro não está em mercadorias, mora, ao contrário, perdido nos valores, de nos estranharmos barcos solitários, e reconhecermos que estando nos barcos ou fora deles somos a humanidade que navega para a recriação ou para o fim.

2 comentários:

Espinho de Quiabento disse...

depois da primeira aparição de "tesouro perdido" leiam ao invés de ponto uma interrogação.

Sophia disse...

Ah! Essa busca incessante... Por ‘domingos’ menos vazios, por vida com mais sentindo!

"Dia de sol e mar: desventuras de um barquinho solitário."

Brilhante texto!